TROVAS

Tábua
de
trovas



========================================== 
Tem muito mais graça a vida
quando a gente tem com quem
repartir bem repartida
a graça que a vida tem.
==================================




1

Sorria, amigo, sorria!
Pois, neste tempo de tédio,
qualquer sinal de alegria
é sempre um santo remédio!

2

Sorriso não paga imposto;
esbanja, portanto, o teu.
Sorrindo com graça e gosto,
acendes também o meu!

3

Irmanemos nossas vidas
em comunhão generosa,
tal como vivem unidas
as pétalas de uma rosa!

4

Sonho um mundo redimido,
que, movido a coração,
lance flechas de Cupido,
não petardos de canhão!

 5

Benditas sejam as vidas
que, alegres, serenas, santas,
vivem a vida envolvidas
em levar vida a outras tantas!

6

Deus fez a Terra... e, ao fazê-la,
deu-lhe o toque comovente:
fez o céu para envolvê-la
num pacote de presente!

7

Quem ama não mata a mata;
quem ama planta, recria.
Quem ama protege e acata
o verde, a vida, a alegria!

8

Do céu nos alerta o Pai,
vendo a Terra ressequida:
– Salvai as águas, salvai,
se quereis salvar a vida!

9

Digo e louvo toda vez
que olho as aguinhas da serra:
– Graças a Deus e a vocês,
há vida ainda na Terra!

10

Se as mentes elas lavassem,
e não os corpos somente,
quem sabe as águas voltassem
às graças de antigamente!...

11

O que ocorre às águas claras,
na alma pura se repete:
dá-se às vezes, e não raras,
que um sujinho as compromete.

12

Vai, riozinho, sem pressa...
lembra ao mar, sem raiva ou mágoa,
que ele é grande, mas começa
num modesto olhinho d’água!
  
13

A natureza protesta
sempre que alguém a maltrata.
– Se matas uma floresta,
vem o deserto e te mata!

14

Eu não tenho uma floresta,
mas tenho em casa um jardim.
O verde mantenho em festa,
na parte que cabe a mim!

15

Aviva-lhe o orvalho o viço,
e a rosa acorda se abrindo...
Aberta, põe-se a serviço
de um mundo amoroso e lindo!

16

Bem-te-vi que bem me vês,
bem-visto sejas também,
hoje e sempre e toda vez
que bem me vires... Amém!

 17

Valente, o verde resiste
à foice, ao fogo, ao trator.
– É a vida que, dedo em riste,
enfrenta o seu matador!

18

Dói muito ver um canário
cantando humilhado e triste
em troca do vil salário
de um punhadinho de alpiste!

19

Tão bela, tão generosa,
símbolo eterno da paz,
pede desculpas a rosa
pelos espinhos que traz!

20

O agricultor que semeia
o arroz, o milho, o feijão
trabalha com Deus à meia
na Obra da Criação.
  
21

Olhe os poetas e as aves...
Veja que, embora não plantem,
Deus lhes retira os entraves
e apenas pede-lhes: – Cantem!

22

Quem dera algum dia eu possa
trocar meu despertador
por um relógio da roça:
o velho galo cantor!

23

Bem cedinho o galo canta,
molhado ainda de orvalho.
A roça, ouvindo-o, levanta,
e um hino entoa ao trabalho!

24

Parece um quadro de artista:
café, café, mais café...
– O verde a perder de vista,
a vista a se encher de fé!

25

Milhões e milhões de estrelas...
Que utilidade terão?
– Só sei, meu irmão, que ao vê-las
sinto Deus no coração!

26

O grande tenor se cala
ante o pássaro silvestre.
– É o discípulo de gala
querendo escutar o mestre!

27

Ouço ainda, ao longe, o canto
de um velho carro de boi...
– Lembrança de um tempo e tanto,
que há tanto tempo se foi!

28

De dia caleja a palma
o irmão que cultiva o chão.
De noite alivia a alma
nas cordas de um violão!
  
29

O fruto é um santo produto
do mais generoso amor.
Por isso é que antes de fruto
quis Deus que ele fosse flor.

30

Numa harmonia perfeita,
completam-se o fruto e a flor:
ele alimenta, ela enfeita;
ele dá força, ela o amor!

31

Belo sonho o que aproxima
estrelas e pirilampos...
– Elas são eles lá em cima;
eles são elas nos campos!

32

Um vaga-lume, isolado,
é só uma pobre luzinha;
no entanto, aos outros somado,
clareia a roça inteirinha!
  
33

Quantas bênçãos traz a chuva
quando rega a plantação:
benze o trigo, benze a uva,
benze a vida em cada grão!

34

Vestem-se as águas de prata,
saltam no espaço vazio.
Findo o show da catarata,
sereno refaz-se o rio...

35

Mesmo soltas e espalhadas,
as pétalas são formosas;
porém somente abraçadas
é que elas se tornam rosas!

Although they are free and scattered,
petals are nice and beautiful,
but only when being embraced
they turn out to be a rose!
(Vertida para o inglês por Djalda Winter)

36

Ó Deus, que nos deste a flor,
e as crianças e as estrelas,
dá-nos agora, Senhor,
a graça de merecê-las!

37

Eu sei por que o passarinho
canta gostoso e se inflama:
– é que ele tem no seu ninho
uma família que o ama!

38

Vi um menino uma vez
mandar aos pais um recado:
– Sou o amor que uniu vocês
e se fez carne. Obrigado!

39

Jogado no mundo, ao léu,
rezava o orfãozinho assim:
– Cuida bem, Papai do Céu,
dos que não cuidam de mim!

40

Matam crianças na rua,
hoje ainda, que que é isto?
– É que Herodes continua
caçando o Menino-Cristo!

41

“Bem-vinda à vida, criança!”,
diz o parteiro sorrindo.
E a frase é um hino à esperança,
no seu momento mais lindo!

42

É mais que um beijo, é uma prece,
aquele beijo miudinho
com que a mãe afaga e aquece
os seus filhotes no ninho!

43

Cuide bem do seu bebê;
forme-o forte, sábio e puro.
Ele é a porção de você
que vai viver no futuro!

44

Brincam na praça os pequenos:
castelos, canções, corrida...
São seus primeiros acenos
aos grandes sonhos da vida!

45

Nas costas, leva a criança
seus livros numa sacola;
nos olhos, leva a esperança
como colega de escola!

46

Louvada seja a harmonia
que eterniza em nosso lar      
o “sim” que nós dois um dia
compartilhamos no altar!

47

A família é um grande bem,
e Deus valoriza-a tanto,
que Ele próprio a dele tem:
Pai, Filho e Espírito Santo.

48

Importa pouco a mobília,
importa pouco a fachada...
O amor que envolve a família
é só o que importa, e mais nada!

49

Como é bom saber que o filho
vida afora alegre vai,
dando forma, força e brilho
aos sonhos do velho pai!

50

A bênção, queridos pais,
que às vezes sois mães também.
Em nome de Deus cuidais
dos filhos que d’Ele vêm!

51

Com que suave ternura
tece a canária o seu ninho!
– Mãe é assim, dengosa e pura...
a nossa e a do passarinho.

52

Na varanda, um quadro lindo:
a jovem mãe e a criança:
– Era a ternura sorrindo,
amamentando a esperança!

53

Da mãe à filha querida:
– Obrigada, meu bebê...
Fui eu quem lhe dei a vida,
mas minha vida é você!

54

O céu deve estar cheinho
de madrinhas, mães e avós...
– Têm lá, em dobro, o carinho
com que cuidaram de nós!

55

Se poder o avô tivesse,
o neto não cresceria.
Crescendo, desaparece,
e leva junto a alegria...

56

O amor é forte, ele aguenta;
se é verdadeiro, ele é infindo:
chega aos oitenta, aos noventa...
quanto mais velho, mais lindo!

57

Embora o mundo não cesse
de fazer guerra e terror,
na família ainda se tece
a grande história do amor!

58

Ah, meu rio, de repente,
o que foi feito de nós?
Ficou tão longe a nascente...
vemos tão próxima a foz!

59

A velhice se avizinha,
porém não me assusta não.
– Eu sei que no fim da linha
Deus me espera na estação!

60

Feliz o idoso que, esperto,
se ampara nesta verdade:
quanto mais velho, mais perto
das bênçãos da eternidade!

61

No pico da quarta idade,
o quadro se faz assim:
ou se crê na eternidade,
ou se põe na tela: “Fim”...

62

De barro se faz o homem,
e de luz principalmente.
O barro, os anos consomem;
a luz eterniza a gente!

63

Na porta da eternidade,
documento não tem vez.
– O cartão de identidade
é o bem que em vida se fez!

64

A vida jamais se encerra...
e é bom sermos imortais.
– Amar você só na Terra
seria pouco demais!

65

As almas, se generosas,
percorrem árduos caminhos...
Só no céu elas e as rosas
ficam livres dos espinhos!

66

Trate o velho com respeito;
dê-lhe o amor que possa dar.
Mas não lhe roube o direito
de a si mesmo governar!

67

Todo idoso é um professor;
curvo-me e beijo-lhe a mão.
No mínimo, ensina amor,
hoje máxima lição!

68

Curvada ao peso da idade,
a vovó, serena e bela,
distrai o tempo e a saudade
entre o novelo e a novela...

69

Quanto mais rápido passa
o tempo a mim concedido,
mais grato eu sou pela graça
de cada instante vivido!

70

Criado por Deus, o rio
nasce limpo e, como nós,
traz consigo o desafio
de limpo chegar à foz.

71

Tem que aos simples se igualar
quem deseja ao céu se erguer:
– O rio só se faz mar
depois de muito descer!

72

Ave-Maria, uma prece
tão gostosa de rezar,
que às vezes mais me parece
cantiguinha de ninar!


73

Olhem a rosa os que ainda
costumam dizer-se ateus.
– Ela é a resposta mais linda
quanto à existência de Deus!

74

Deus não vem na grande nave;
Deus não vem no furacão.
Deus vem qual brisa suave,
e entra em nosso coração!

75

Terno, amigo e generoso,
quis Deus se configurar
no abraço do pai saudoso
no filho que volta ao lar!

76

Se de Deus vem a mensagem,
não carece tradutor.
Em geral vem na linguagem
de uma estrela ou de uma flor!

77

Deus não põe ponto final
na biografia da gente.
– Quer nossa alma, imortal,
junto à d’Ele eternamente!

78

A vida no mundo é um treino,
a etapa em que o Treinador
nos prepara para o reino
definitivo do amor!

79

– Passei o dia a serviço
de um pobre encontrado ao léu...
– Pois é, disse o Pai, com isso
ganhaste, meu filho, o céu!

80

Até como terapia,
crer em Deus faz muito bem:
– banha a gente na alegria
que da eterna luz provém!

81

Certeza só têm os rios
sobre aonde vão chegar...
Por mais que sofram desvios,
seu destino é sempre o mar!

82

Que bom que ninguém mais usa
consagrar heróis de guerra...
– Hoje herói é quem recusa
macular com sangue a Terra!

83

Ao cérebro, o coração
manda amorosa mensagem:
– Somente unidos, irmão,
seremos de Deus a imagem!

84

Virão tempos diferentes
em nossa história, e os vereis:
haverá mais Tiradentes
do que Silvérios dos Reis!

85

A bênção, Joaquim José,
sonha o teu sonho de novo...
Acende outra vez a fé
no coração do teu povo!

86

Em resposta à ofensa e à intriga,
ensina o amor: “Faça o bem!”
– O amor é sábio: não briga,
perdoa cem vezes cem!

87

Ou o amor enfim nos faz
desarmar o coração,
ou do cachimbo da paz
nem as cinzas sobrarão!

88

Quem tem amigos leais
tem muito o que agradecer:
bons amigos valem mais
que o mais que se possa ter.

89

Coragem de gente grande
é aquela em que se distingue
alguém assim como Gandhi,
São Francisco, Luther King!

90

São de cristal ou de barro
nossas vaidades... tão só.
Um baque, um tombo, um esbarro,
e tudo reduz-se a pó!

91

Como é triste o desencanto
daquele que a duro custo
desbafa e diz em pranto:
– Eu me cansei de ser justo!

92

Se aos heróis e aos grandes sábios
devemos tão bela herança,
muito mais a quem nos lábios
traz o canto da esperança!

93

Que alegre alívio provoca,
na alma e no coração,
o abraço que a gente troca
numa troca de perdão!

94

Se alguém se torna importante,
por certo alguém o ajudou.
Mesmo o Amazonas, gigante,
de afluentes precisou!

95

Pensei que ser grande fosse
razão de alegria... Errado:
o rio, pequeno, é doce;
o mar, imenso, é salgado.

96

A renúncia corresponde,
muita vez, a muito amar;
como quando o Sol se esconde
para que brilhe o luar!

97

A história, através dos anos,
ensina a grande lição:
– o destino dos tiranos
será sempre a solidão!

98

Grande mesmo é quem descobre
que ser grande é ser alguém
que abre espaço para o pobre
tornar-se grande também.

99

Honestos há sem ser bons
e há bons que honestos não são.
–  É a soma de ambos os dons
que faz o bom cidadão.

100

Vinde, amigos, vinde e vede
o quanto pode o perdão:
– derruba qualquer parede
que nos separe do irmão!

101

Cidadania é civismo,
sobretudo é comunhão;
é ajuda mútua, é altruísmo,
partilha justa do pão.

102

Se lhe derem mais apoio;
se ele vir que o bem faz bem,
tenha certeza: há de o joio
tornar-se trigo também!

103

Morre o sábio... enorme bem
perde o mundo em tal momento.
Seu patrimônio, herda alguém;
não no entanto o seu talento!

104

O talento, em nossos dias,
é o que engrandece um país.
– Mais que a força dos Golias
vale o gênio dos Davis!

105

O livro mudou o enredo
da história da humanidade:
– Antes dele, a treva e o medo;
depois dele a liberdade.

106

Na biblioteca há mil sábios
a nosso inteiro dispor.
– Sem sequer abrir os lábios,
cada livro é um professor!

107

Palavras produzem fartas
e tão belas construções:
com elas fez Paulo as Cartas,
fez os seus versos Camões!

108

A  palavra acalma e instiga;
a palavra adoça e inflama.
– Com ela é que a gente briga;
com ela é que a gente ama!

109

Ah, que profunda saudade
invade uma Academia
a cada vez que um confrade
deixa a cadeira vazia!

110

Gari, que há luas e luas
varres a pública via...
hás de achar limpas as ruas
que ao céu vão levar-te um dia!

111

Vaidade, doença triste
que nos condena a estar sós...
Não nos deixa ver que existe
ninguém mais além de nós.

112

Trabalhas tanto, formiga,
enquanto, ó cigarra, cantas.
No entanto, basta de intriga:
– são duas tarefas santas!

113

A regra é tirar vantagem,
porém prefiro a exceção:
– quero a inocente coragem
dos puros de coração!

114

– Que sentença a mãe de Judas,
se o julgasse, lhe daria?...
– Em sendo mãe, não te iludas:
mil vezes o perdoaria!

115

Não presta a pena que importe
num mal que o mal não redime.
Toda sentença de morte
é um crime pior que o crime.

116

Mesmo o maior dos gigantes
não tem poder permanente:
– Pode a Lua, por instantes,
cobrir o Sol totalmente!

117

Que vida pobre a do rico...
Noite e dia, o ano inteiro,
mirando o ilusório pico
de um sonhozinho – o dinheiro...

118

O mundo esqueceu que existe
o ponto de exclamação...
De tão seco, amargo e triste,
perdeu de vez a emoção!

119

O lírio, a lira, o lirismo;
o amor, a festa, a canção...
Que pena que o consumismo
transforma tudo em cifrão!

120

Ismo, ismo, ismo, ismo...
e o medo está sempre em alta...
– Experimentem lirismo,
que talvez seja o que falta!

121

Acaso fizeste a Lua?
Acaso fizeste a rosa?
Então que ciência é a tua,
tão solene e presunçosa?...

122

Cumprem a Lua e as estrelas
o ofício de serem belas...
E, entretanto, para vê-las,
só o poeta abre as janelas!

123

Astronauta, não destrua
meu direito de sonhar...
Deite e role sobre a Lua,
porém me deixe o luar!

124

Anoitece. Bela e nua,
começa a rosa a orvalhar-se...
– Um raiozinho de lua
virá com ela deitar-se.

125

Lua cheia chega e assume
pose plena de rainha:
cega a estrela e o vagalume
e acende a noite sozinha!

126

Tenho a alma sempre em festa,
e é fácil saber por quê:
– minha vida é uma seresta,
na qual a lua é você!

127

Minha amada, com bom jeito,
mesmo ausente me domina...
Deixa a saudade em meu peito
como rainha interina!

128

Ao mesmo tempo em que é doce,
ah como é triste a saudade...
– Ela é assim como se fosse
uma ex-felicidade!

129

Prometi-lhe, amada minha,
mil estrelas, as mais belas.
Bobagem... você sozinha
brilha mais que todas elas!

130

Quem preza a vida divide-a,
como o cedro acolhedor
que adota por filha a orquídea,
e dá-lhe suporte e amor!

131

Tal qual dois rios se abraçam,
formando um só rio após,
dois “eus” pelo amor se enlaçam,
passando a chamar-se “nós”!

132

Sonhador desde criança,
não sonho entretanto em vão.
No sonho eu nutro a esperança,
que nutre o meu coração!

133

Ah, poeta, como é lindo
teu trabalho, e quão fecundo...
– Noite e dia produzindo
sonhos novos para o mundo!

134

Deus me deu livre vontade;
porém, por sorte, incompleta:
– não me deu a liberdade
de deixar de ser poeta!

135

Eu tenho fé nas pessoas,
em todas, sem exceção,
que todas elas são boas,
quando lhes damos a mão!

136

Quem dera, um dia, as fronteiras
fossem elos nos unindo,
e houvesse, em vez de barreiras,
somente a placa: – Bem-vindo!

137

Amai-vos, e as derradeiras
muralhas hão de cair.
– Havendo amor, as barreiras
não têm razão de existir!

138

Eu sei que será difícil,
mas a fé me diz: – Verás
transformar-se cada míssil
num mensageiro da paz!

139

Vem vindo um tempo sem bombas,
sem tanques e sem canhões.
Falcões darão vez às pombas,
e os fuzis aos violões!

140

Dirá Deus: “Faça-se a paz,
e todos deem-se as mãos!”
E então, meu filho, verás
que lindo é um mundo de irmãos!


Maringá

2011 


===================================== 

 Num tempo em que tanta guerra
enche o mundo de terror,
benditos os que, na Terra,
semeiam versos de amor!

=====================================