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sexta-feira, 17 de junho de 2022
TIO JOSÉ, UM SÁBIO
TIO JOSÉ, UM SÁBIO
A. A. de Assis
Cheguei a Maringá com 21 anos, em janeiro de 1955. Antes havia passado um ano e meio em Bauru, onde morava numa pensão que hospedava estudantes e outros rapazes. Foi nessa época que conheci um homem chamado José, bom velhinho adornado por longas barbas brancas e que pitava cigarros de palha. Dizia ter tido pouca escola, mas estava sempre lendo alguma coisa e na sala dele havia uma estante cheia de livros. Era vizinho nosso. De tardinha punha na calçada uma cadeira de balanço e ficava horas ali tomando a fresca. Tinha já uns 80 anos e curtia papear com os moços. A gente o chamava de Tio José.
Numa daquelas tardes ele estava com uma Bíblia nas mãos. Um dos rapazes confessou:
– Admiro demais as pessoas que acreditam firmemente em Deus, no céu, na vida eterna. Eu também gostaria de acreditar assim, mas tenho alguns bloqueios. Ateu sei que não sou, porém fico meio perdido. Queria entender como é exatamente Deus.
– Exatamente eu também não sei – disse Tio José –, mas procuro simplificar as coisas. A mim me basta o que São João ensina – “Deus é Amor”.
– Sim, sim. Só que aí vem outra pergunta: como é que se define o amor?
– Se eu lhe pedir para definir o azul, o que você dirá?
– Bem, o azul... o azul é o azul.
– Pois é: o amor é o amor. Não tenho uma palavra para explicar precisamente o que é o amor, ainda mais o amor divino. Poderia dizer que é um espírito, um sopro, uma energia, uma inteligência, um sentimento, uma potência, um impulso. Ou tudo isso e muito mais. Resumindo: podemos entender Deus (o Amor) como um espírito extremamente generoso, presente em todos os lugares, e de maneira especialmente forte em cada um de nós.
– E como é que Deus (o Amor) age em nossa vida?
– Age fazendo crescer em nós a vocação para a bondade; impulsionando a gente para a prática do bem; para o apego à verdade, à justiça, à paz; para a proteção à natureza; para o carinhoso amparo aos carentes, às crianças, aos velhinhos; para a sensibilidade em relação às coisas belas... Enfim: Deus é o Amor amando a gente em tempo integral, ensinando a gente a ser a cada dia melhor e guiando a gente rumo ao céu.
– Então como se explica a existência de tanta maldade no mundo?
– Difícil de entender, difícil de explicar. Mas assim como há o Espírito do Amor, que sempre deseja o melhor para nós, penso que as pessoas estejam também sujeitas a algum distúrbio mental, à má influência do ambiente em que vivam, ou ainda à atração de alguma força que as puxe para a prática de ruindades. Daí a necessidade de a gente estar sempre vigilante, a fim de não se deixar arrastar para um caminho torto. De minha parte, como sou um homem de fé, e porque procuro ter Jesus na mente e na alma, continuo apostando que no final o bem triunfará.
– Valeu, Tio – disse o jovem. – Parece que estou começando a entender. Muito obrigado. Qualquer hora dessas a gente conversa mais. Me deixe beijar-lhe as mãos.
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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 16-6-2022)
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