quinta-feira, 1 de abril de 2021

O amoroso chamado

 O amoroso chamado

A. A. de Assis

 

Ekkaleo > ecclesia > eglesia > iglesia > igreja. –  Ainda menino, no Ginásio Fidelense, aprendi com o professor Expedito uma lição importante: “Quando você estiver em dúvida sobre alguma questão complexa, procure a resposta lendo as palavras por dentro”.

     Em clima de Páscoa, perguntei a mim mesmo o que significaria exatamente “igreja” e qual a sua exata missão. Tentei então ler “igreja” por dentro, partindo da forma grega da palavra – “ekkaleo” (em latim “ecclesia”). O núcleo semântico está em “kaleo”, que contém a ideia de chamar, de onde temos, por exemplo, “To call” em inglês, “clamar > chamar” em português.

     Até aí tudo bem: igreja é chamar. Há, porém, um complicador: o prefixo “ek > ex” = fora, que pode levar-nos a ler “ekkaleo” como “chamar para fora”. Mas por que “para fora”?... Para fora do mundo? Para fora da vida real? Parece bem mais coerente entender que a missão da igreja seja “chamar para dentro aqueles que estejam fora”; convidá-los à con-versão, à metanoia.

     Não sei se posso, mas ao falar de igreja falo pensando numa igreja-comunidade-do-amor; ou seja, o conjunto de todas as pessoas que, independentemente de sua condição religiosa, prezam e praticam as virtudes da bondade, da justiça e do amor. Em suma: os seres humanos preparados para partilhar uma convivência fraterna e pacífica com os semelhantes. Homens e mulheres intrinsecamente felizes, dos quais, por isso mesmo, se espera que, por amor, queiram chamar para junto deles os que, por algum motivo, estejam afastados.

    Chamar de volta o filho pródigo e fazer para ele uma grande festa caso aceite compartir de novo o aconchego do lar. Chamar de volta a ovelha desgarrada e trazê-la no colo caso aceite o convite para ao rebanho outra vez se unir. Chamar e carinhosamente acolher na casa do Pai todos os irmãos e irmãs necessitados de compreensão, apoio e afeto.

     Porém, primeiro que tudo, mediante orações e atos de bondade, chamar Deus para morar em nosso coração e, coletivamente, no coração da igreja, a fim de fazer de nós pessoas melhores, mais generosas, e da igreja uma família mais santa, mais solidária e acolhedora. Só assim teremos condição para servir de exemplo, e poder de convencimento para garantir aos “de fora” que o que se propõe partilhar com eles é algo realmente bom.

     De tão bondoso que é, quis Deus um dia oferecer à humanidade a maior de todas as chances. Enviou-nos o próprio Filho, Jesus Cristo, que por 33 anos habitou entre nós. Jesus aceitou até ser pregado na cruz para nos redimir, sarar, salvar. Veio chamar-nos de volta, curar nossas angústias e ensinar a gente a organizar uma sociedade fraterna, amorosa e justa. Continua chamando: “Venham a mim todos vocês que estão cansados, sofridos, carentes de ternura, alegria e paz”. 

     Utopia? Sonho de poeta? Muito mais: esperança e fé.

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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 01-4-2021)

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