sábado, 5 de fevereiro de 2022

O AVIÃO, O JIPE E A MULHER

 O AVIÃO, O JIPE E A MULHER

A. A. de Assis
Eram meados dos anos 1960. Numa conversa com o saudoso engenheiro agrônomo Aníbal Bianchini da Rocha, ele me disse algo muito interessante, de que nunca mais me esqueci: que três contribuições foram fundamentais na colonização do norte-noroeste do Paraná – a do avião, a do jipe e a da mulher.
No começo, aqui não havia estradas, muito menos algo parecido com pista de pouso. O avião, cavalo voante do desbravador moderno, descia em qualquer clareira da mata, qualquer chãozinho coberto de grama, despejando gente arrojada em cima da terra que ansiava por parir fartura. Contavam-se proezas incríveis daqueles ginetes do ar, que perturbavam o sono das onças com o ronco festeiro dos seus teco- tecos.
Abertos os primeiros caminhos a golpes de foice, facão e enxada, o jipe acompanhou o avião no mergulho do homem floresta a dentro. Trotando nos picadões, rosnava qual fera de aço, pulando buracos, amassando espinhos, esmagando cobras, empurrando tocos, saltando valões, desafiando o que surgisse à frente.
Os caminhos, aos poucos, viraram arremedos de estradas. E o jipe ainda nelas seguia atravessando túneis de poeira vermelha em épocas de sol, engatando reduzida e calçando correntes em dias de chuva, subindo e descendo aqueles morros escorreguentos que nem quiabo. O avião piruetando no céu, o jipe saracoteando no chão, transportando o agito da pioneirada para o cheiroso sertão selvagem. O homem invadindo a mata, guloso de plantar sementes para enricar ligeiro.
Mas o homem não teria vencido como venceu, mesmo com os seus aviões malucos e os seus jipes desassombrados, se a seu lado não estivesse a mulher.
Só Deus sabe o que enfrentaram aqui aquelas heroicas senhoras, naqueles tempos de total desassistência e desconforto.
Sair de sei lá onde, com as crianças no colo e as panelas nas costas, para viver num lugar sem nenhum recurso ou conforto, convenhamos que foi coragem das grandes.
Os maridos, machado e enxada nas mãos, derrubando mato, arrumando a terra, plantando roças, criando galinhas e porcos para reforçar o rango.
Elas em casa criando filhos, cozinhando inhame, lavando roupas que o pó e o barro transformavam numa espécie de encerado. E mais: rezando pra Deus ajudar, que só Deus podia ajudar na completa desproteção daquele fim de mundo.
O Doutor Bianchinil estava certo. Se eu fosse prefeito, por justiça e fartura de razões, mandaria erguer um monumento para as nossas valentes pioneiras.
Outro para o avião teco-teco. Outro para o jipe.
Quem sabe alguém acolha a ideia?
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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 03-02-2022)

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