APÓSTOLO HONORÁRIO
A. A. de Assis
De repente me deu de pensar no grande apóstolo que teria sido Aristóteles caso ele tivesse convivido com os seguidores de Jesus Cristo. Na minha imaginação, vi-o lá na velha Grécia entrando no túnel do tempo e logo após desembarcando na Galileia, pronto para de imediato matricular-se como discípulo na escola do Mestre dos mestres.
Com o seu admirável currículo, foi recebido de braços abertos. Pediram-lhe apenas que antes aceitasse participar de uma rápida sabatina. Sem problema. O filósofo grego, hábil orador, em breve discurso resumiu suas ideias:
1. O ser humano foi criado para ser feliz. Para tanto, desde o início da história vem passando por um longo processo de aperfeiçoamento. A esse processo dá-se o nome de “educação” (do latim “ex-ducere” = trazer à luz; ou seja: trazer à tona e pôr em ação um conjunto de virtudes potencialmente contidas num ser originalmente rústico).
2. Desenvolve-se a educação mediante o que chamamos de “civilização” (do latim “civilis”), de onde temos também civismo, civilidade, cidade, cidadania.
3. Pode-se, assim, entender educação como evolução do ser humano do estágio de “zoon” para o estágio de “anthropos” – transformação do animal em homem e do homem em cidadão.
4. Simplificando: entende-se educação como o empenho em criar nas pessoas, desde a infância, o hábito de gostar das coisas justas e boas (“ethos” > ética), preparando-as para uma convivência harmônica no que nós gregos chamamos de “pólis” (= cidade) – comunidade de pessoas livres, pacíficas, democráticas, honestas, prestativas, sociáveis, generosas.
5. Desde sua origem até o estado em que atualmente se encontra, o ser humano vem mantendo uma contínua e sofrida luta interior, na qual se confrontam defeitos (egoísmo, ódio, inveja, ira, arrogância etc.) e virtudes (amor, bondade, ternura, alegria, solidariedade etc.).
6. Mediante a educação, busca-se reduzir ao mínimo os defeitos e ampliar ao máximo as virtudes. Quanto maior a predominância das virtudes, mais alto o grau de felicidade.
Pedro bateu o martelo: “Pode parar aí. Já deu para sentir que você é um pensador do bem. Precisa apenas familiarizar-se com a nossa linguagem. Por exemplo: o que você chama de ‘civilização’ nós chamamos de ‘salvação’ (do latim ‘salvare’, que vem de ‘salvus’ > ‘salus’, de onde temos saúde, sadio, salutar, sanidade, santidade, são. Em outras palavras: você associa educação com ‘civilização’ (entendida como fortalecimento da saúde moral); nós associamos educação com ‘salvação’ (entendida como fortalecimento da saúde espiritual)”.
João pediu um aparte: “Vocês falam em excelência do caráter, nós falamos em excelência da alma, porém queremos o mesmo: ver os homens e as mulheres convivendo como irmãos e irmãs, num clima de mútuo respeito e amorosa colaboração. Enfim, queremos todos alcançar a plena felicidade, que costumamos chamar de bem-aventurança – no tempo e na eternidade”.
Pedro encerrou a sessão: “Dê cá um abraço, caríssimo Aristóteles. Você é muito gente boa. Além de avalizar sua matrícula como discípulo, pedirei ao Mestre Jesus que lhe conceda um upgrade, promovendo-o logo de início a Apóstolo Honorário”.
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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 21-7-2022)
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