BRINCANTES

Trovas


brincantes


1

Trova é bom para a saúde,
faz amigos, dá prazer.
Talvez até nos ajude
a esquecer de envelhecer...

2

Veja a mata: é lindo o verde;
veja o céu: o azul é belo.
Por que é que então eu vou ter de
manter o humor amarelo?...

3

Moderna e esperta, a formiga
à cigarra se juntou:
– uma canta, enquanto a amiga
monta o circo e vende o show...

4

Fim do filme... Na saída,
pergunta à pulga o pulgão:
– Voltamos a pé, querida,
ou vamos tomar um cão?
  
5

O sapo coaracoacoacha
ante a sapa, a sua estrela.
– Ela é um poema, ele acha,
e estufa-se todo ao vê-la!

6

Finalmente um cão bilíngue,
que, além do nativo au-au,
se expressa e até se distingue
fluentemente em miau...

7

No carrão recém-comprado
da motorista barbeira:
“Atenção, muito cuidado...
amaciando carteira!”

8

Certos tipos importantes
parecem Marte – um deserto:
vistos de longe, brilhantes;
cascalho apenas, de perto!...
  
9

Como foi, como não foi,
conte dois que eu conto um...
Num belo inglês, diz o boi,
olhando a Lua: moon... moooon...

10

Porco sofre: além do nome,
que o deixa triste e avexado,
quem o frita e à mesa o come
sói chamá-lo de capado!

11

O nobre faz e acontece,
porém me responda, ó meu:
se o trabalho é que enobrece,
como é que ele enobreceu?...

12

Diz o sábio, e quase chora,
por modéstia ou caçoada:
– Sou doutor honóvis fora;
quer dizer: doutor em nada!

 13

Não te cases por dinheiro...
sai dessa... tô te falando...
Afinal, qualquer banqueiro
empresta a juro mais brando!

14

A mulher, que é toda encanto,
lembra a abelha, meiga e boa:
dá mel gostoso; no entanto,
se for preciso, ferroa!

15

Num momento de euforia,
cedemos-lhe uma costela.
Fomos cedendo... e hoje em dia
quem manda no mundo é ela!

16

Muito cara que se julga
ladino, culto, elegante,
no fim não passa de pulga
com mania de elefante!

17

Uma andorinha, voando,
sozinha não faz verão...
Passando, no entanto, em bando,
chove adubo em profusão!

18

Corre a bola, deita e rola,
salta de pé para pé...
Quica, requica, rebola,
no grito do povo: – olééé!

19

No reino dos passarinhos,
joão-de-barro é o burguesão:
– de todos os seus vizinhos,
só ele mora em mansão...

20

Pernilongo em meu ouvido
faz zunzum... zunzum... zunzum...
Julga-se, ao certo, o exibido
chofer de fórmula um...

 21

Criança que muito apronta
exige rigor dos pais:
– Água mole não dá conta,
se a pedra é dura demais!

22

O povo sempre descobre
metaforinhas incríveis:
couve-flor: repolho nobre;
as hortas: jardins comíveis...

23

Ao notar a Lua cheia,
surpreso o Sol resmungou:
– Se um mês atrás eras meia,
quem foi que te engravidou?...



24

Pediste, na vez passada,
que eu melhorasse a comida...
Pois hoje está caprichada:
vou servir vespa cozida!

 25

Coitado... tão pobrezinho,
que até para dar risada
tem que pedir ao vizinho
a dentadura emprestada!...

 26

De um caboclo perspicaz
ensinando a geografia:
– O çul fica sempre atrás...
com cedia ou sem cedia...

27

É natural que aconteça,
ao cometa e a certa gente,
por ter pequena a cabeça,
mostrar a cauda somente...

28

Pastel, pudim, rabanada,
e o mais que te apetecer...
Nada disso engorda nada:
basta apenas não comer!
  
29

Pra casar moça bonita,
carece exibi-la não...
Que nem lá no Sul se dita:
“Bom vinho escusa pregão!”

30

Todos nós temos um pouco
ou de troiano ou de grego;
por isso este mundo louco
jamais há de ter sossego...

31

Antiguidade, doutor,
é coisa muito engraçada:
algo que cresce em valor
quando não vale mais nada...

32

Misto de sábio e de herói,
ensina o pobre de leve:
Quem, de seu, nada pissói
é que mais tranquilo veve!
  
33

Entre o passado e o futuro,
mudou o amor um bocado:
– o que o vovô fez no escuro,
faz o neto escancarado!

34

Ah, como é útil a avó,
com seus cuidados e afetos!
Já o avô, serve tão-só
pra ensinar besteira aos netos...

35

Avó é a mãe que imagina
que a sua parte já fez...
mas, quando a missão termina,
começa tudo outra vez!

36

Mas ora-ora, dirás,
é fácil ouvir estrelas...
– Quem leva um chute por trás,
além de as ouvir... vai vê-las!
  
37

– Na briga lobo-cordeiro,
qual deles terá razão?
– Depende, meu companheiro,
de qual dos dois é o patrão...

38

Os gaúchos, mui serenos,
dizem rindo: – “Calma, irmão...
Se o mundo tá mais ou menos,
então tá louco de bão!”

39

Madrugada... canta o galo...
cruzam-se o ócio e o labor:
volta a moçada do embalo;
pega a enxada o lavrador!

40

Se de jeca lhe dão nome,
ele responde: – “Tá bão...
Mas, se ocê não passa fome,
é graças ao meu feijão!...”

 41

Esta é uma antiga lorota,
que jamais se esclareceu:
– Se Judas nem tinha bota,
como foi que ele a perdeu?...

42

Quando se casa a enteada,
mais a madrasta se ouriça:
Além de mãe emprestada,
agora é sogra postiça...

43

Quem com vida dá banquete,
mas não convida o povão,
finda a vida, um alfinete
pode furar-lhe o balão!

44

O bom discurso amoroso
dispensa texto comprido.
Basta um “te gosto” gostoso,
murmurado ao pé do ouvido...

 45

Depois de um café quentinho
e de uns pãezinhos de queijo,
melhor que tudo é o carinho
com que me serves um beijo!

46

Era um guri tão terror,
que a escola inteira o temia.
Cresceu... virou professor...
paga com juro hoje em dia!

47

Se tens filho, escuta aqui,
que um lembrete eu vou deixar-te:
– Guri que já faz guri,
se fica solto, faz arte!...

48

Tipo da coisa marota,
ambígua e um tanto arriscada:
perguntar a uma garota
se ela quer jogar pelada...

49

Não há diferença alguma
se a festa é pobre ou de gala.
– Tanto noutra quanto numa,
quem bebe demais se rala!

50

Cuidado, amigo, atenção...
não beba o primeiro trago.
– Quando se escuta o trovão,
o raio já fez o estrago!

51

Atrás das outras não perca
o seu juízo... cuidado!
Boi que muito pula cerca
volta um dia desfalcado...

52

Me desculpe se isto aflige-a,
mas o progresso endoidou:
mais premia a calipígia
do que a moça que estudou!...

53

O bom cabrito não berra;
gato sabido não mia...
Menos sofre e menos erra
quem menos fala hoje em dia.

54

“Tem o amor certas razões
que nem a razão conhece.”
– Por exemplo: as emoções
que um gordo cheque oferece...

55

Morre o peixe quando aboca
seu jantar com muito anseio...
Sobretudo se a minhoca
traz anzol como recheio!

56

Canarinho, quando canta,
que será que o faz cantar?
– Sei lá... mas a mim me espanta
que ele cante sem cobrar...

57

Pica-pau, sossega o taco...
faz uma pausa, ó carinha!
Teu toque-toque enche o saco
da passarada inteirinha...

58

De biquíni ou minissaia,
a verdade se revela...
– Não há mentira na praia:
feia é feia, bela é bela!

59

Mosquito para a mosquita,
nadando na sopa quente:
– Eta piscina bonita...
a pena é que engorda a gente!

60

De tal modo a rosa é amada,
que o cravo mói-se de ciúme...
– É o que dá ter namorada
que esbanja encanto e perfume!
         
61

De todos ela atraía
mil sorrisos, mas... que dó:
casada, sofre hoje em dia
os maus humores de um só...

62

A laranja era tão doce,
que o limão ficou com medo:
– por inveja, ou lá o que fosse,
acabou ficando azedo...

63

Muito teimosa, a franguinha
com um ganso se casou.
Ao ter um ovo, tadinha...
de cesárea precisou!

64

O que faz a boca torta
é o cachimbo – assim se diz.
Quem bate a cara na porta
entorta a boca e o nariz!

65

Hoje os  rios se parecem
com certos tipos sabujos:
quanto mais descem, mais crescem;
quanto mais crescem, mais sujos.

66

Ao fim de qualquer mandato,
somando-se o dito e feito,
no saldo exibe o relato
muito mais dito que feito...

67

De longe se escuta o eco
da turma de cara cheia,
no alvoroço do boteco
pondo em dia a vida alheia...

68

Muito sepulcro caiado,
que bota pose de puro,
no claro é distinto e honrado...
mas como apronta no escuro!

 69

Gente com medo de gente
na selva dita cidade.
– Preciso mudar, urgente,
para a selva de verdade...

70

Convido-os a partilhar
uma gostosa jantinha:
massa com frutos do mar,
ou seja, pão com sardinha...

71

Sempre que ensaia um passeio,
assim se apresta o janota:
reparte o cabelo ao meio,
bota a calça, calça a bota.

72

Rodo, rodo, rodo, rodo,
devagar a divagar...
divagando sobre o modo
menos vago de vagar...

73

Tão boa é aquela senhora,
tão generosa e tão pura,
que nem passando a ter nora
perdeu jamais a ternura...

74

Pergunto: – Serás a lenda
que eu vi no mar e na areia?
Se rindo, linda, ela emenda:
– Não sou ainda... sereia!

75

A prata, em nosso cabelo,
faz ninho se a idade vem...
Que pena ela não fazê-lo
em nossos bolsos também!

76

“Deixe-o que faça e aconteça”,
diz a vovó com carinho...
E eis que de ponta-cabeça
vira-lhe a casa o netinho!...
  
77

A ciência hoje é um colosso,
com tudo fora de centro:
faz laranja sem caroço,
gravidez sem filho dentro...

78

Também na fauna a justiça
é às vezes discricionária:
dá mole ao bicho-preguiça,
explora a abelha operária...

79

Quem rabo alheio tesoura,
cuidar do próprio convém...
– Tanto varreu a vassoura,
que virou lixo também!

80

Coceirinha furibunda,
coça embaixo, coça em cima...
Quando coça na cacunda,
sinto cócegas... na rima!

 81

Como se diz lá na roça,
o amor é um bichim-de-pé:
quanto mais a gente coça,
mais boa a coceira é...

82

Vingança é coisa de gente
tresloucada ou matusquela...
– A lei do dente por dente
faz tempo ficou banguela!

83

Verde, amarelo, vermelho...
bi-bi... fon-fon... ron-ron-ron...
Mulher, sem pressa, ao espelho,
na esquina ajeita o batom...

84

Tal qual o povo, pisada
por tantos, a todo instante,
a alegria da calçada
é o tropicão do passante!...
  
85

Depois de tomar uns treco
para aquecer a moringa,
o trovador de boteco
soluceia... e a rima pinga!

86

Andorinha sobe e desce,
sobe e desce, pousa e come...
Sobe, sobe, faz um “s”,
desce, come, sobe e some...

87

Vira-bosta não trabalha;
põe ovos em ninho alheio...
Por isso é que se atrapalha,
e vira um troço tão feio!

88

Rato-rato, rói o rato
um roto resto de pão...
Rente, rouco, rosna um gato,
come o rato e rouba pão!

89

"Tirei dez em português",
diz-me o neto, erguendo os pés.
"Na verdade, sete e três,
mas, vô... sete e três são dez!"

90

Quando, à noite, o Sol se deita,
a Lua, em grande escarcéu,
chama a poetada e aproveita:
faz uma farra no céu!

91

Fez-se o casório... no entanto,
o noivo não tinha o dom...
Por vingança, a noiva, em pranto,
foi reclamar no Procon!

92

Do Natal ao Ano Novo
a folga é pouca... O ideal
é deixar de folga o povo
do Ano Novo até o Natal...
  
93

Debulhando, debulhando,
se enchia o pilão de milho...
Depois, coisando, coisando,
se enchia a casa de filho!

94

O lobo e o cordeiro, airosos,
vão comer juntos... Depois,
os homens, bem mais gulosos,
vão comer juntos os dois!...

95

Que bela ficas, mocinha,
se pões, por esmero e gosto,
ideias na cabecinha,
mais que pinturas no rosto!

96

“Que delícia isso no espeto!”,
grita faminto o glutão,
quando ao pódio, no coreto,
sobe o touro campeão...

97

Proclama o glutão roliço,
vendo à mesa a feijoada:
– Vamos botar tudo isso
em pratos limpos, moçada!

98

– Aceitas dar-me os deleites
da próxima contradança?...
– Aceito, desde que aceites
não me apertar contra a pança!

99

Trata o vovô com respeito,
ou logo o castigo vem:
– dele herdarás só o direito
de ficar velho também...

100

Poeta, à porta do Pai,
entra fácil, certamente.
Se São Pedro se distrai,
São Francisco empurra a gente!


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