sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

O livro do Obama

 O livro do Obama

A. A. de Assis


Por conta dos meus 87 anos e dos olhos facilmente cansáveis, leio devagarinho, no máximo uma hora em cada sentada. O livro do Obama – “Uma terra prometida” (primeiro volume de uma série de três) – tem mais de 700 páginas. Comecei a leitura antes do Natal. Ainda não terminei, mas estou gostando bastante.

     O texto é bem escrito, boa tradução, linguagem moderninha, descontraída, enxuta, e a história é por demais interessante. Vai desde ingênuas brincadeiras com crianças até momentos de altíssima tensão.

      Destina-se a múltiplas categorias de leitores, porém mais especificamente às pessoas de algum modo envolvidas com política. Fala das manhas e artimanhas que enredam a vida pública em toda parte do mundo, dos pequenos acordos costurados na informalidade das cidadezinhas até complexos arranjos tecidos nos bastidores das mais poderosas cúpulas. Fala também dos velhos vícios de estrategistas que tentam tirar vantagem lançando uns contra os outros os diversos segmentos da sociedade. Aquela surrada tática: dividir para conquistar.

     Lutar contra esses e outros maus costumes foi a proposta básica que levou o ex-presidente norte-americano Barack Obama a disputar eleições. “A política não precisa ser o que as pessoas pensam que ela é. Pode ser mais”, diz ele logo no início da obra, na p. 54. E acrescenta: “O tipo de política que eu buscava era uma política que construísse pontes”.

     Não foi sem razão que ele ganhou em 2009 o Prêmio Nobel da Paz. Em vez de dividir, unir. Em vez de erguer muros, estender pontes. Pacificar os ânimos. Irmanizar os que se julgam ou são julgados diferentes. Com firmeza, mas sem ódio, ajudar a corrigir as injustiças sociais. Enfim fortalecer o ideal de comunidade, a fim de tornar possível a construção de uma democracia de gente grande. E diz mais, na p. 370: “Ingressara na política para levar um ensino melhor aos jovens, ajudar as famílias a ter assistência à saúde, auxiliar na produção de alimentos nos países pobres – esse tipo de poder era o meu verdadeiro objetivo”.

     Obama deixa clara sua convicção de que uma democracia de tal nível está longe de superar os limites do sonho. O ser humano ainda não alcançou tão elevado grau de civilidade. Falta vencer muitas barreiras: o egoísmo, a vaidade, a ambição desenfreada. Mas nem por isso se deve aposentar a esperança. A política pode, sim, ser muito melhor do que tem sido.

     Construir pontes. Isso não significa cessar a competição. A democracia precisa de competição e revezamento. Precisa ter partidos. Gente de esquerda, direita, centro. Precisa de choque de ideias. Precisa de forças de oposição que fiscalizem e instiguem quem estiver no poder. Faz parte do jogo. A velha máxima continua valendo: “da discussão nasce a luz”.

     Discutir sim. Competir sim. Porém sem golpes baixos, sem truques, sem barganhas sujas. Competir respeitando o adversário, valorizando o voto do povo, pondo em primeiro lugar a busca do que de fato seja melhor para a população.

     Estou gostando de ler “Uma terra prometida”. Barack Obama é um líder muito especial.

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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 08-01-2021)

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