sábado, 8 de maio de 2021

Rapsódia lírica

 Rapsódia lírica

A. A. de Assis

No dia 8 de maio de 1945 eu tinha 12 anos de idade. Às 8 horas em ponto soou a sineta e todos nós, alunos e professores do Ginásio Fidelense, formamos filas no pátio para a cerimônia que costumeiramente se realizava antes de irmos para as salas. Mas naquela manhã havia algo diferente no ar. O diretor, professor Expedito, num impecável terno branco de linho taylor 120, regeu o canto do Hino Nacional e deu a grande notícia: – ACABOU A GUERRA!!!

     Em seguida informou que o governo decretara feriado e que portanto estávamos dispensados das aulas. Saímos fazendo o maior alvoroço pelas ruas da cidade, misturando-nos à multidão que brotava de todas as casas cantando, gritando vivas, soltando fogos.

     Essa mesma alegria ecoava no país inteiro, enquanto as emissoras de rádio transmitiam empolgados discursos e músicas cívicas. A mais tocada era a Canção do Expedicionário, criada em homenagem aos Pracinhas, carinhoso apelido dado aos soldados da FEB – Força Expedicionária Brasileira, que lutaram na Europa contra o nazi-fascismo.

     Letra do célebre poeta Guilherme de Almeida, melodia do maestro Spartaco Rossi. Composição vencedora num concurso superdisputado, promovido em 1944 pelo jornal paulistano “Diário da Noite”. Normalmente os hinos patrióticos exaltam virtudes como audácia, valentia etc. Guilherme, porém, preferiu, em vez de hino, compor uma canção – um popurri de versos de Gonçalves Dias, frases de José de Alencar e trechos bem conhecidos do cancioneiro popular. O resultado foi uma belíssima rapsódia lírica, um mapa do que de mais representativo havia então na poesia do nosso povo.    

     Até hoje, quando ouço a Canção do Expedicionário, fico arrepiado. A música é muito bonita e a letra é genial. Vou transcrever abaixo algumas estrofes. Leia bem devagarinho, frase por frase. Os mais idosos, principalmente, vão talvez até chorar.

     “Você sabe de onde eu venho? / Venho do morro do engenho, / das selvas, dos cafezais, /
da boa terra do coco, / da choupana onde um é pouco, / dois é bom, três é demais. / Venho das praias sedosas, / das montanhas alterosas, / do pampa, do seringal, / das margens crespas dos rios, / dos verdes mares bravios / da minha terra natal.

    “Por mais terras que eu percorra, / não permita Deus que eu morra / sem que volte para lá, /
sem que leve por divisa / este ‘V’ que simboliza / a vitória que virá.

    “Eu venho da minha terra, / da casa branca da serra / e do luar do sertão. /
Venho da minha Maria, / cujo nome principia / na palma da minha mão, / braços mornos de Moema, / lábios de mel de Iracema / Estendidos para mim. / Ó minha terra querida, / da Senhora Aparecida / e do Senhor do Bonfim.

    “ Nossa vitória final, / que é a mira do meu fuzil, / a ração do meu bornal, / a água do meu cantil, / as asas do meu ideal, / a glória a do meu Brasil.”

      Sugestão: ouça no Google a música e veja a letra completa. Se puder, repasse ao Vovô.

==========================

(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 06-5-2021) 

Nenhum comentário: