quinta-feira, 13 de agosto de 2020

O duelo JP X Haroldo

 O duelo JP X Haroldo

 

A. A. de Assis

 


Em algumas cidades é comum a população dividir-se em duas torcidas: no Rio o Fla-Flu, em Porto Alegre o Grenal, na capital paranaense o Atletiba. Em Maringá, ao longo dos anos 1960, houve algo semelhante, porém no campo político: de um lado os seguidores do Doutor João Paulino Vieira Filho, líder do PSD (depois Arena-1), do outro lado os seguidores do Doutor Haroldo Leon Peres, líder da UDN (depois Arena-2).
Ambos advogados (JP promotor de Justiça), ambos excelentes oradores. Como candidatos ao mesmo cargo ou como apoiadores de outros candidatos, eram sempre eles as estrelas maiores dos respectivos grupos partidários. Em todas as eleições aqui realizadas naquela época supermovimentada, lá estavam eles empolgando multidões em comícios gigantescos.
Até que um dia, no auge de uma campanha supercalorosa, a coisa pegou fogo de vez. Não me lembro de quem partiu o desafio, mas a cidade toda ficou ouriçada ao saber que o Doutor Haroldo e o Doutor João Paulino se dispuseram a tirar suas diferenças enfrentando-se num debate público na Praça Raposo Tavares.
Foram armados dois palanques, um em frente ao outro. Jornalistas e radialistas, alguns vindos de Londrina, Curitiba, até de São Paulo, atraídos pelo noticiário ecoado na semana anterior, disputavam espaço para a cobertura do fantástico duelo. O desfecho poderia ser uma cena mais ou menos como aquela que a gente via no final dos velhos faroestões (quem sacaria mais rápido?)...
Porém é claro que isso não aconteceria; os competidores não chegariam a tanto. Eram dois homens valentes, mas o entrevero haveria de ficar só no disparo de desaforos verbais. O medo era em relação ao público, aquele povão gritando e xingando, cercado apenas por uma cordinha colocada no meio para separar as duas torcidas. Imaginem se aquele pessoal todo começasse a trocar sopapos.
Um coro estrondoso de cada lado entoando slogans. Foguetes. Homens e mulheres empunhando faixas. Locutores tentando acalmar as plateias, fazendo cera para ganhar tempo enquanto se aguardava a chegada dos debatedores. Policiais fazendo o possível para controlar o empurra-empurra. 
De repente a cordinha rebentou, a multidão se embolou, virou um tremendo sururu. Porém por sorte sempre tem alguém com a cabeça no lugar e que nessas horas aparece para maneirar os ânimos.
Um cidadão de voz forte subiu a um dos palanques, pegou o microfone e fez o apelo que valeu como um jato d’água: “Parem com isso!... Por favor, parem!... Acaba de chegar uma notificação do Doutor Juiz Eleitoral determinando que fica proibida a realização deste comício. Nem o Doutor João Paulino nem o Doutor Haroldo Leon Peres nem ninguém mais fará discurso algum aqui. Não vai ter debate coisa nenhuma. Peço a todos os senhores e senhoras que se dispersem e voltem em paz para as suas casas”.
Silêncio geral. Alguns chegaram a falar em milagre. O fato é que as duas torcidas interromperam a gritaria e um a um foi indo todo mundo embora. O duelo acabou em zero a zero. Graças a Deus.

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(Crônica publicada no Jornal do Povo – Maringá – 30-7-2020)

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